REPÚBLICA
POPULISTA (1946-1964)
O período que vai de 1945
(fim do Estado Novo) até 1964 (golpe militar) apresentou características que
remontam à década de 1930, que trouxe profundas mudanças na estrutura social e
econômica brasileira. Houve um avanço na industrialização, grande
desenvolvimento urbano, com aumento da população.
O urbanismo favoreceu o
crescimento da burguesia industrial, da classe média e do proletariado. O
fortalecimento destas novas forças sociais trouxe uma mudança no aparelho
estatal (governo): a permanência do populismo,
transformado em prática política costumeira, com o intuito de conquistar o
apoio das massas (população), principalmente a urbana.
*O fenômeno do populismo consiste
na manipulação dos interesses da classe trabalhadora por parte do Estado (ou
dos políticos).
É nesse contexto que o
período entre a ditadura Vargas e a ditadura militar se desenrolam tendo os
seguintes presidentes da República:
Governo
de Eurico Gaspar Dutra (1946/1951)
Marcado pela aliança política
PSD/PTB apresentou aspectos conservadores. Em setembro de 1946 foi promulgada
uma nova Constituição, onde se manteve a República Presidencialista e o
princípio federativo. Foi instituído o voto secreto e universal e a tripartição
do poder (três poderes: legislativo, executivo e judiciário).
Externamente seu governo foi
marcado pela aproximação com os Estados Unidos (início da Guerra Fria e a opção
brasileira pelo capitalismo). Como reflexo desta política houve o rompimento
das relações diplomáticas com a União Soviética e o Partido Comunista foi
colocado na ilegalidade.
No plano interno, Dutra
procurou colocar em prática o primeiro planejamento global da economia
brasileira, o Plano SALTE (Saúde, ALimentação, Transporte e Energia).
Verificou-se uma enorme
inflação, em razão do aumento da emissão de papel-moeda. Ao mesmo tempo
elevava-se o preço do café e das matérias-primas, auxiliando a balança
comercial brasileira; foi adotada a economia liberal (sem intervenção estatal),
dando liberdade ao capital estrangeiro, liberdade às importações, congelamento
de salários (combate à inflação) e o fechamento e proibição dos cassinos.
Governo
de Getúlio Vargas (1951/1954)
A segunda presidência de
Vargas foi marcada pelo nacionalismo e pelo intervencionismo estatal na
economia, trazendo insatisfações ao empresariado nacional e ao capital
internacional.
Em 1951, o nacionalismo
econômico de Vargas efetivou-se no projeto de estabelecer o monopólio
estatal do petróleo. Esse programa, que mobilizou boa parte a população
brasileira tinha como slogan “O Petróleo é nosso”, resultando na criação da Petrobrás, empresa estatal que monopolizou
a exploração e o refino do petróleo no Brasil.
Vargas planejava também a
criação da Eletrobrás, com o objetivo de monopolizar a geração e distribuição
de energia elétrica. Propôs, no ano de 1954, um reajuste de 100% no Salário Mínimo,
como forma de compensar as perdas salariais, em virtude da inflação.
A aplicação de uma política
nacionalista, bem como a aproximação de Vargas à classe trabalhadora,
preocupava a classe dominante. Temia-se a criação de uma República
Sindicalista, como na Argentina de Perón. O líder da oposição a Vargas era o
jornalista Carlos Lacerda, que denunciava uma série de irregularidades do
governo. Lacerda também era o porta-voz dos setores ligados ao capital
estrangeiro.
Neste contexto ocorreu o
atentado da Rua Toneleiros, uma tentativa de assassinar Carlos Lacerda. No
episódio foi morto o major da aeronáutica Rubens Vaz (segurança de Lacerda). Os
resultados da investigação apontaram que Gregório Fortunato, principal
guarda-costas do presidente Vargas, como o responsável pelo acontecimento. Embora
nunca tenha ficado provada a participação de Getúlio Vargas no episódio, este
foi acusado pelos opositores como o mandante do atentado.
Em 23 de agosto de 1954 o vice-presidente, Café
Filho rompeu com o presidente; no mesmo dia, o Exército divulga um manifesto
exigindo a renúncia de Vargas. Na madrugada de 24 de agosto, Getúlio Vargas
suicidou-se com um tiro no coração. Sua atitude é encarada por alguns
estudiosos como seu último ato político, pois impediu um golpe de Estado, que
estaria em curso. Foi encontrada a seguinte...
CARTA
TESTAMENTO DE GETÚLIO VARGAS
"Mais uma vez, as
forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam
sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem; caluniam e não me dão o
direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para
que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e, principalmente,
os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e
espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de
uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de
liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao Governo nos braços do povo. A
campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais
revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros
extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do Salário
Mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na
potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a
funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculizada até o
desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja
independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os
valores de trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançaram até 500% ao
ano. Na declaração de valores do que importávamos, existiam fraudes constatadas
de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o
nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma
violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a um pressão
constante incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo a mim mesmo,
para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a
não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem
continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis
minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis
em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos
vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para uma reação. Meu
sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada
gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a
vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que
pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e
hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais
será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu
sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra
a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. 0 ódio, as infâmias, a
calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha
morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e
saio da vida para entrar na história".
(Getúlio Vargas)
Governo
de Café Filho (1954/1955)
Após a morte de Vargas, Café
Filho, seu vice, assumiu o poder. Nas eleições de 1956, o candidato da aliança
PSD-PTB, Juscelino Kubitschek, venceu. O período de governo de Café Filho
apresentou uma crise política quando o coronel Bizarria Mamede, da Escola
Superior de Guerra, proferiu um discurso contra a posse de JK.
O então Ministro da Guerra,
general Henrique Teixeira Lott, resolveu punir o coronel, ferindo a hierarquia,
pois a punição deveria ser dada pelo Presidente da República, ao qual o
ministro era subordinado.
Café Filho foi afastado da
presidência, por motivos de saúde, assumindo o presidente da Câmara de
Deputados, Carlos Luz. Este era do PSD, da ala conservadora, e inimigo político
de Juscelino. Carlos Luz resolveu não punir o general Mamede, tornando-se
cúmplice de suas declarações e forçando o pedido de demissão do general Lott.
Ficava clara a tentativa de
um golpe e o General Lott, um defensor da legalidade constitucional e da posse
dos candidatos eleitos, antecipou-se aos golpistas. Lott não assinou o pedido
de demissão e organizou um contragolpe. Ordenou que as tropas fossem às ruas,
reassumiu o poder e afastou Carlos Luz da presidência.
A presidência foi entregue
ao presidente do Senado, Nereu Ramos, que governou até a posse de Juscelino
Kubitschek (31/01/56).
Governo
de Juscelino Kubitschek (1956/1961)
Governo marcado por grande
desenvolvimento econômico. Política econômica delineada pelo Plano de Metas
(Alimentação, Educação, Indústria, Transporte e Energia – dica “ALEITE”) que
tinha como lema “Cinquenta anos de progresso em cinco de governo.”
A realização do Plano de
Metas resultou na expansão e consolidação do "capitalismo associado ou
dependente" brasileiro, pois o processo de industrialização ocorreu em torno
das empresas estrangeiras (as transnacionais). Estas empresas controlaram os
setores-chave da economia nacional – maquinaria pesada, alumínio, setor
automobilístico, construção naval – ocasionando a desnacionalização
econômica.
A política econômica
de JK acarretou processo inflacionário, em razão da intensa emissão de
papel-moeda;
A política de abertura ao capital
estrangeiro resultou em remessas de lucros e royalties (importância
cobrada pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção,
marca, entre outros, ou pelo autor de uma obra, para permitir seu uso ou
comercialização ao exterior). O período
de JK foi marcado, também, pela construção
de Brasília e pela criação da Sudene (Superintendência para o
Desenvolvimento do Nordeste).
A era JK foi também marcada
por crises políticas, ocorrendo duas tentativas de golpe: o levante de
Jacareacanga e o de Aragarças – insurreições por parte de alguns militares. No
final de seu governo a dívida externa brasileira aumentou consideravelmente (cerca
de 30%), levando o país a recorrer ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para
obter empréstimos.
Em 1960 houve eleições e
Jânio da Silva Quadros, então governador de São Paulo foi o vencedor, tendo
como partido político a UDN e como vice-presidente João Goulart, da coligação
PSD/PTB.
Governo
de Jânio Quadros (1961)
Jânio Quadros assumiu a
presidência em um contexto de grave crise financeira. O Brasil apresentava
intensa inflação, crescimento da dívida externa e déficit na balança de
pagamentos. Visando restabelecer o equilíbrio financeiro do país, Jânio
realizou um reajuste cambial, restringiu os créditos, incentivou as exportações
e congelou os salários. Iniciou a apuração de denúncias de corrupção
administrativa e nomeou uma comissão para definir a limitação da remessa de
lucros para o exterior.
No campo externo, Jânio
Quadros procurou estabelecer uma política externa independente dos Estados
Unidos, aproximou-se dos países socialistas ao restabelecer as relações
diplomáticas com a União Soviética, enviou o vice-presidente à China e
prestigiou a Revolução Cubana, ao condecorar com a Ordem do Cruzeiro do Sul um
de seus líderes, Ernesto “Che” Guevara. Estas atitudes preocuparam os EUA e a
classe dominante nacional.
A oposição ao governo tinha
em Carlos Lacerda, governador do Rio de Janeiro, seu principal representante,
que articulava um Golpe de Estado.
Sem apoio político Jânio
acabou renunciando no dia 25 de agosto de 1961, após sete meses de governo. Sua
renúncia nunca foi satisfatoriamente explicada, mas acredita-se que teria sido
pela tentativa de golpe. A renúncia gerou uma grave crise política, envolvendo
a posse, ou não, de seu vice-presidente João Goulart.
Governo
de João Goulart (1961/1964)
João Goulart, cujo apelido nos
meios sindicais era Jango, não era bem visto pela elite nacional e pelas Forças
Armadas. Era tido como agitador, com tendências comunistas. Representava uma
ameaça à “segurança nacional” trazendo risco às instituições democráticas do
país. Sob estas alegações, os ministros militares pediram ao Congresso Nacional
a permanência de Raniere Mazzilli na presidência, que assumira interinamente
visto que Jango estava na China.
Contra a tentativa de golpe,
Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul e cunhado de João Goulart,
liderou a chamada “campanha de legalidade”, que buscava garantir a posse de
João Goulart.
Para conciliar as duas
correntes, favorável e contra a posse, o Congresso Nacional aprovou um ato
adicional em 02 de setembro de 1961, estabelecendo o Sistema Parlamentarista
no Brasil. Com o parlamentarismo, os poderes do presidente foram limitados,
sendo que o primeiro-ministro é que governaria de fato.
O primeiro ministro eleito a
exercer foi Tancredo Neves. Diante do fracasso do parlamentarismo, foi
convocado um plebiscito (votação
popular) para decidir sobre a manutenção ou não do regime. O resultado foi
a volta do presidencialismo (06/01/63).
Iniciava-se uma segunda fase
do governo de João Goulart, marcada pela execução do chamado Plano Trienal, que
buscava combater a inflação e realizar o desenvolvimento econômico. O plano
deveria ser acompanhado de uma série de reformas estruturais, denominadas Reformas
de Base, que incluíam a Reforma Agrária, a Reforma Eleitoral (estendendo o
direito de votos aos analfabetos), a Reforma Universitária (ampliando o número
de vagas nas faculdades públicas) e a Reforma Financeira e Administrativa (procurando
limitar a remessa de lucro ao exterior e os lucros dos bancos).
O descontentamento com a
política do governo aumentou a partir do dia 13 de março de 1964 quando, num
comício na Estação (estrada de ferro) Central do Brasil, no Rio de Janeiro, diante
de 200 mil trabalhadores, Jango radicalizou sua promessa de reforma agrária,
lançou a ideia de uma “reforma urbana” e decretou a nacionalização das
refinarias particulares de petróleo.
Como reação, uniram-se os
grandes empresários, proprietários rurais, setores conservadores da Igreja
Católica e a classe média urbana, que realizaram a Marcha da Família com Deus e
pela Liberdade.
Em seguida houve uma revolta
dos marinheiros do Rio de Janeiro, servindo de pretexto para o Golpe Militar:
alegava-se que a disciplina nas Forças Armadas estava em jogo. Na noite de 31
de março de 1964 o general Olympío Mourão Filho (arquiteto do falso Plano Cohen
- 1937) colocou a guarnição de Juiz de Fora em direção ao Rio de Janeiro. No
dia 1º de abril João Goulart foi deposto e exilou-se no Uruguai, no dia 2 de
abril.
Encerrava-se assim o Período Democrático (1946
a 1964) e iniciava-se a República Militar no Brasil ou, como é mais
conhecida, a Ditadura Militar.
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